sábado, 11 de junho de 2011

Repensando o controle social

Hoje se encerrou em Campinas a VII Conferência Municipal sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Este encontro ocorre a cada dois anos, tendo como principais objetivos avaliar as políticas públicas municipais que se relacionam com as pessoas com deficiência e eleger os representantes deste segmento populacional no Conselho Municipal dos Direitos das Pessoas com Deficiência (CMPD-Campinas). Infelizmente, por problemas de saúde, não pude participar da Conferência, mas aproveito a ocasião para fazer uma reflexão acerca destes instrumentos de controle social.
Os Conselhos com representantes da sociedade civil e do poder público foram consolidados como fóruns de democracia participativa na Constituição “cidadã” de 1988. Já haviam experiências anteriores, mas a partir dali passaram a ser constituídos espaços institucionais para tratar de temas como saúde ou educação, e também de grupos populacionais historicamente discriminados e/ou socialmente vulneráveis. Tardiamente, pelo menos na maioria dos municípios, as pessoas com deficiência passaram a se organizar politicamente e exigir a criação destes fóruns, que depois também passaram a existir nas esferas estaduais e a nível federal.
No caso de Campinas, as discussões para criação do CMPD se deram no final da década de 90. Originalmente, chamou-se o Conselho de CMADENE, pois ele se refira aqueles com “necessidades especiais” (eufemismo abandonado no século XXI). Embora não tenha participado do primeiro grupo de conselheiros, tive essa chance já em 2002, representando o segmento das pessoas com deficiências nos quatro anos seguintes (tendo sido presidente do Conselho entre 2004 e 2006). Esta experiência me manteve durante muito no tempo do lado daqueles que defendem a importância e eficácia deste instrumento de controle social, mas hoje penso um pouco diferente.
Analisando em perspectiva, pelo menos no caso de Campinas, mas creio que não somente aqui, a valorização dos Conselhos como instâncias de participação e monitoramento das políticas públicas depende, demasiadamente, da posição do poder executivo local frente a estas instâncias. Em outras palavras, se não há uma firme disposição do poder público no sentido de levar em conta as deliberações dos Conselhos, estes se enfraquecem e atuam quase que de modo figurativo.
Em tese, não deveria ser assim e isso também tem haver com o poder que as legislações conferem aos Conselhos no momento de sua criação. Aqueles que se caracterizam como “deliberativos” têm mais força do que os definidos apenas como “consultivos”. Mas mesmo no primeiro caso, a palavra final resulta quase sempre da vontade do poder executivo, que pode “esvaziar” os Conselhos de diferentes formas, seja indicando representantes frágeis ou desinteressados, seja simplesmente assumindo para si a decisão final quanto à execução da política pública.
Não quero com isso rejeitar os Conselhos como fórum de controle social, mas chamar a atenção para o fato de que o outro lado desta relação, com o poder concentrado no executivo local, é o movimento social fragilizado. Restringindo a discussão para o universo das pessoas com deficiência, e pautado pela experiência de Campinas, o fortalecimento do poder público estimulou e correspondeu ao enfraquecimento simultâneo do movimento sócio-político das pessoas com deficiência. Como participante deste processo, assumo erros e me sinto co-responsável. Creio que uma mudança efetiva na nossa capacidade de controle social passaria pela reorganização deste movimento em Campinas.
Em resumo, penso que antes de lutar pela valorização dos Conselhos, é preciso refletir sobre as causas que levaram ao enfraquecimento da nossa mobilização. Na verdade, ao iniciar este texto, queria apenas utilizar a ocasião da Conferência para falar, de forma geral, sobre as mudanças nas formas de participação e controle social. Acabou virando uma reflexão interna e particularizada...paciência. Agora estou curioso: como terá sido a VII Conferência aqui em Campinas?

4 comentários:

  1. Olá Vinicius. Você tocou num ponto fundamental, pois frente a uma cidadania enfraquecida o funcionamento dos conselhos é seriamente comprometido. Sem dúvida continuam válidos, mas os desafios para resgatar a concepção inicial são muito sérios e não podem ser ignorados por todos aqueles interessados na democratização do Estado e das políticas públicas.

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  2. Realmente Waldir, nesse quadro de fragilização os Conselhos ficam esvaziados e sem condições de exercer o controle social. Para mudar isso, o movimento social deve se fortalacer para melhorar a qualidade da sua participação e exigir do poder público, no mínimo, atenção e respostas frente às deliberações do Conselho. Mas, infelizmente, fazer isso na prática não é fácil...

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  3. Oi Vi,
    Adorei o texto. Imagino que tenha sido difícil respeitar a sua regra de não escrever muito mais que uma página.

    Sei bem como é essa angústia quando vivemos o enfraquecimento do movimento e sentimos que estamos deixando a (ou alguma das) peteca cair. Tenho refletido muito sobre isso, principalmente quanto a importância de ocupar espaços que deveriam ser democráticos.

    Embora eu reconheça o grande avanço dos últimos anos na criação e fortalecimento de espaços de controle social e a crescente importância que esses espaços vem ocupando nos processos de criação e avaliação de políticas públicas; considero que ainda estamos engatinhando no que diz respeito aos formatos adotados e à representatividade.

    A questão dos formatos, como você bem disse, depende do conselho e de como foi seu processo de institucionalização. A maioria dos conselhos são consultivos, tornando suas discussões (e a energia gasta nelas) meras sugestões. E mesmo nos conselhos deliberativos as cadeiras são distribuídas de forma que poucos grupos da sociedade civil se vejam representados, mesmo porque, a maioria das pessoas não tem conhecimento da existência desses espaços, ou tem e não sabem como participar deles.

    Acho que um ponto fundamental é que pra além da criação dos espaços deveria ser gasta mais energia em processos de informação e formação dando condições para mais grupos se verem representados. Já existem cursos de formação de conselheiros, mas eles são muito específicos e voltados às pessoas que já estão inseridas nesse contexto. Nunca vi nenhuma chamada na TV para alguma conferência, nem uma explicação do que são os conselhos e como funcionam.

    Por fim... O papel dos movimentos sociais na manutenção desses espaços é fundamental, se esses espaços não forem ocupados eles acabarão sendo enfraquecidos e/ou abandonados (ou pior, utilizados pra legitimar políticas de pouco interesse social). Porém, esses movimentos são constituídos por pessoas, na maioria das vezes poucas lideranças carregando um movimento nas costas, quando essas poucas pessoas enfrentam momentos de maior dificuldade o movimento se enfraquece. Acho que o grande desafio nosso (movimentos sociais) é nos manter em constante renovação, sempre procurar formar novas lideranças e/ou fortalecer outros movimentos com objetivos e ideologia parecidos. Talvez essa seja uma forma de diminuir nossa vulnerabilidade (lembrando que enfrentamos bilhões de reais em publicidade dizendo que as pessoas devem se competitivas e individualistas).

    já escrevi demais...
    Abração!

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  4. Vitão, com sinceridade, seu comentário é, na verdade, um novo (e ótimo) texto sobre o tema. Concordo plenamente contigo e suas colocações mostram que compartilhamos realmente da mesma angústia. Em resumo, se não conseguimos incentivar, provocar, formar uma base social mais forte, numérica e qualitativamente, os espaços institucionais como os Conselhos ficam esvaziados e até mesmo sem sentido prático. O desafio é grande, ainda mais na nossa sociedade competitiva e individualista, como você bem colocou. Abração!

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