Na semana passada, o Congresso aprovou o Regime Diferenciado de Contratações (RDC) a ser utilizado na Copa de 2014 e nas Olimpíadas de 2016. Este texto não pretende discutir especificamente o RDC e tampouco as questões positivas e negativas que envolvem a realização destes eventos no país (http://vggarcia30.blogspot.com/2011/05/copa-do-mundo-e-olimpiadas-no-brasil.html). Quero apenas utilizar este caso para ilustrar o que pode ser chamado de “princípio de presunção da roubalheira” que vigora no país. Trata-se de uma desconfiança generalizada em relação aos agentes e órgãos públicos.
Até certo ponto, é compreensível que este princípio exista. Há, de fato, um histórico nada positivo de desvios de dinheiro público e exemplos diversos da falta de ética e decoro dos políticos e homens públicos no Brasil (embora não só deles). Ocorre que, em minha opinião, esta presunção de que inevitavelmente vai haver roubalheira mais atrapalha do que ajuda o avanço de uma discussão séria sobre mecanismos de fiscalização, processos licitatórios e, em última instância, valores republicanos que separam os interesses públicos dos privados.
Tomando como exemplo o RDC, há argumentos favoráveis e contrários a sua utilização. Porém, grande parte das pessoas, inclusive (para não dizer, especialmente) jornalistas, deixam-se levar por uma análise superficial, de que o governo está simplesmente permitindo roubalheira e corrupção. O RDC é defendido por setores do governo como uma estratégia que aponta na direção contrária, pois dificultaria o acordo prévio entre as grandes construtoras (que, aliás, reagiram pública e negativamente ao projeto, no que foram apoiadas pelo presidente do Senado, José Sarney). Por outro lado, existem críticas pertinentes quanto à flexibilização exagerada que o RDC permite.
Seja como for, só não acho que é saudável começar a discussão dando como fato que o objetivo final é autorizar a corrupção e pronto. O país dispõe de mecanismos, instituições e órgãos de controle, internos e externos, que vêm sendo aperfeiçoados ao longo do tempo. Há a Controladoria-Geral da União, o Procurador Geral da República (que já criticou o RDC), o Tribunal de Contas da União e o próprio Congresso Nacional. Vivemos num país onde a imprensa tem plena liberdade de opinião e as pessoas podem se manifestar, se organizar e criticar severamente o governo, com todo o direito.
Em contra-ponto, fico espantado como alguns adoram exaltar, por exemplo, como na China as obras de infra-estrutura são feitas rápida e eficientemente. O país asiático até pode nos ensinar em termos de política econômica (maneja bem câmbio e juros), mas não é exemplo de transparência pública ou liberdade dos direitos civis e políticos. No outro extremo, o paradigma dos EUA é adorado por aqueles que vivem criticando o excesso de impostos e os desperdícios de dinheiro público no Brasil. É inegável que os EUA avançaram enormemente e alcançaram um elevado patamar de riqueza material, mas são modelos para o atendimento na área de Saúde ou Previdência Social?
A nossa realidade está longe de ser a ideal, mas é a de um país em que, 30 anos atrás, o Presidente da República era escolhido pela vontade pessoal de um general do Exército (foi assim com Médici para Geisel e deste para Figueiredo). A Constituição Brasileira tem pouco mais de 20 anos, e sofreu duros golpes no seu processo de regulamentação durante a hegemonia do neoliberalismo na década de 90. Nas últimas décadas, as instituições têm avançado e é preciso parar com a mania de que tudo está sempre errado no Brasil. Em síntese, temos que ver as coisas em perspectiva história e fugir da simplicidade das fáceis generalizações.
Se o ufanismo ingênuo é prejudicial, a presunção da roubalheira também é. Acompanha-se, discuta-se e investigue-se tudo aquilo que envolve a política e o dinheiro público no Brasil. Mas sem julgamentos e sentenças precipitadas, vale para o direito, vale para a política.
Via Facebook:
ResponderExcluirFernão Vale curtiu isto.
Você e Eduardo Fagnani curtiram isso.
Valeu Fernão e Edu, abraços!
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ResponderExcluirDe: Vinicius Garcia
Data: 27 de junho de 2011 10:29
Assunto: Re: novo texto
Para: Daniel Höfling
Valeu Dani, concordo. Não podemos nos iludir, mas essa coisa de sempre achar que no Brasil nada funciona, que aqui vai dar errado e tal, é muita chata e nos atrapalha.Síndrome do vira-lata, como já dizia Nelson Rodrigues.
Abração,
Vini.
Em 27 de junho de 2011 09:04, Daniel Höfling escreveu:
Muito didático o texto, Vini. E tocou em um ponto central na discussão sobre o Brasil: o fato de acharmos que o país é ruim, que tá tudo errado, que nada funciona, que os outros são melhores....é a síndrome do paga-pau que nos acompanha desde sempre.....precisamos parar com isso: somos uns dos maiores países do mundo, em todos os sentidos. Tá na hora de parar de pensar e agir como gente pequena. Somos grandes, com potencial de nos tornarmos gigantes.
Daniel de Mattos Höfling
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ResponderExcluirDe: Vinicius Garcia
Data: 29 de junho de 2011 08:22
Assunto: Re: novo texto
Para: Silvia Pereira de Brito
Obrigado Sílvia!
Bom saber que compartilhamos, também, essa visão.
Bjs,
Vinicius.
Em 28 de junho de 2011 16:38, Silvia Pereira de Brito escreveu:
Vinícius!
Mais uma vez vc acerta em cheio!!!!!!
Parabéns, assino embaixo!
Bjs.
Silvia.